FONTE: Mais Que Vencedores - William Hendriksen

Os
cidadãos de Laodicéia eram ricos - e sabiam disso! Eles eram insuportáveis.
Mesmo as pessoas da Igreja demonstravam essa atitude orgulhosa, desafiadora e
presunçosa.
Talvez imaginassem que sua riqueza era sinal de algum favor especial de Deus.
A certa altura eles começaram a pensai- que "tinham chegado
lá". Estavam imbuídos do espírito que dominava a cidade. Orgulham-se de
suas riquezas espirituais.[2]
Se os habitantes de Laodicéia tivessem dito o que pensavam, sua linguagem seria
como se segue - ouçam atentamente a um desses insuportáveis jactanciosos que
representa o resto deles: "Estou rico e abastado, e não preciso de
cousa
alguma" (verso 17).
E fácil
ver que essas pessoas não eram perturbadas por qualquer consciência de pecado.
Jamais pensariam em ficar distantes, com olhos tristes e cabeças tombadas,
suspirando e dizendo: "O Deus, sê misericordioso para comigo,
um pecador". Eles haviam "chegado lá"! Conforme seu próprio
modo de pensar, não tinham necessidade de qualquer
admoestação
e podiam ser mornos quanto a qualquer exortação. "Morno" é a palavra.
O povo de Laodicéia sabia exatamente o que isso significava. Morno,
tépido,
lasso, claudicante, tíbio, sempre pronto a se comprometer, indiferente,
desatento: Uma atitude de "somos todos boa gente aqui em Laodicéia".
O autor deste livro se tornou pessoalmente familiarizado com essa atitude da
parte de alguns membros de Igreja. É impossível se fazer qualquer coisa por
essa gente. Com os pagãos, quer dizer, com aqueles que
nunca tiveram contacto com o evangelho e que,
portanto, são "frios" quanto a ele, pode-se fazer alguma coisa. Com
cristãos sinceros e humildes, pode-se trabalhar com alegria. Mas com esses
"somos todos boa gente aqui em Laodicéia", nada há que possa ser
feito. Até mesmo o próprio Cristo não pode suportá-los. Uma emoção, um
sentimento é aqui atribuído ao Senhor que em nenhum outro lugar lhe é atribuído
na Bíblia. Não lemos que ele está ofendido com eles. Nem que ele está irado
contra eles. Não, ele está enojado de tais indecisos. E não apenas levemente enjoado, mas
totalmente nauseado. "Assim, porque és morno, e nem és quente nem frio,
estou pronto a vomitar-te de minha boca." Sabendo muito bem que toda a sua
religião é somente muita simulação e fingimento, muita hipocrisia, o Senhor se
apresenta como o exatamente oposto: "Estas coisas diz a testemunha fiel e
verdadeira". Noutras palavras, o Senhor revela-se aqui como aquele cujos
olhos não somente vêem exatamente o que se passa no coração dessa gente de
Laodicéia, mas cujos lábios também declaram, exatamente, a verdade que vêem.
Ele declara, sobretudo, que ele é "o princípio da criação de Deus",
isto é, a fonte de toda a criação (çf. 21.6; 22.13; Jo 1.1; Cl 1.15-18). "Gente de
Laodicéia, vocês precisam tornar-se novas criaturas: precisam de novos
corações. Tornem-se a mim, portanto, para que sejam salvos."
Embora ele
esteja totalmente enojado dessa igreja porque ela falha em seus
deveres de
portadora da luz, não obstante, há graça aqui: maravilhoso amor cheio de
carinho e admoestação. Cristo, na verdade, não diz: "Irei vomitá-los de minha
boca", mas: "Estou prestes a vomitar-te de minha boca". O Senhor ainda
aguarda. Ele envia essas cartas a fim de retirá-los dessa mornidão espiritual.
E, verdadeiramente, severo na sua condenação exatamente porque ele é manso e
carinhoso, amoroso e gracioso.
A essa
congregação, e, portanto, ao seu membro típico, o Senhor diz: "...pois
dizes:
Estou rico e abastado, e não preciso de cousa alguma, e nem sabes que tu és
infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu". Deve-se notar que não é
"miserável", mas lastimável. Quem é mais lastimável do que um
indivíduo que imagina ser um bom cristão, quando, na realidade, o próprio Cristo
está sumamente enojado dele? Leia essas palavras lentamente e tente ver a
figura de um indivíduo que tenha estas cinco características combinadas:
vileza,
mesquinhez, bajulação servil, cegueira e nudez!
"Aconselho-te."
Quão suave ele fala - não "ordeno-te", mas "aconselho-te".
Cristo aconselha essa igreja a comprar dele - o "de mim" é bastante
enfático - ouro refinado pelo fogo, vestes brancas e colírio. Em poucas
palavras: "compre salvação", pois a salvação é ouro que enriquece (2
Co 8.9); é veste branca que cobre a nudez ou nossa culpa e reveste-nos com
justiça, santidade e alegria no Senhor; é colírio que, quando possuído, não
mais nos deixa cegos. A salvação tem de ser comprada, isto é, precisamos obter
a justa posse dela. Mas como podem, aqueles que são pobres, e tudo o mais,
comprar qualquer coisa? Leia Isaías 55.1ss. e você terá uma
resposta!
Há algo
mais maravilhoso em toda a Bíblia do que isso, que a essa gente morna com que o
Senhor está tão desgostoso a ponto de vomitá-los de sua
boca, ele se dirija com estas palavras: "Eu repreendo e disciplino a
quantos amo. Sê, pois, zeloso e arrepende-te.
Eis que estou à porta e bato..."
Observe
que o Senhor está instando para que a porta seja aberta. Não apenas isso, mas -
como fica evidente no próximo verso - ele mesmo é quem está batendo repetidas
vezes e chamando o pecador. Note a frase "se alguém ouvir a minha
voz". Não é a pessoa no interior que toma a iniciativa. Não, esse texto
está em total harmonia com a Bíblia toda nos ensinamentos concernentes à graça
soberana. É o Senhor que está à porta, ou contra a porta - ninguém o chamou -
batendo, não uma, mas repetidas vezes: é ele quem chama, e sua voz no evangelho
aplicado ao coração pelo Espírito é o poder de Deus para a salvação. Dessa
forma, essa passagem faz justiça tanto à graça divina soberana quanto à
responsabilidade humana.[3]
"Se
alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com
ele, e ele comigo." Observe que ele diz "se alguém..."; o Senhor
dirige-se a indivíduos. A salvação é uma coisa muito pessoal; quando o coração
é aberto pela voz do Senhor, esse princípio de regeneração se torna ativo para
que, pelo Espírito Santo, o indivíduo regenerado abra a porta e receba a
Cristo. O abrir da porta é o que, geralmente, é chamado de conversão. Não
confunda
regeneração (Jo 3.3ss.; At 16.4) com conversão. Aqui, na expressão: "Se
alguém abrir a porta", a referência é feita à conversão, ao arrependimento
e à fé em Cristo, como o contexto claramente indica. O Senhor entra (Jo 14.23).
Que maravilha! Ele desce do trono de sua glória a fim de cear com esse
indivíduo que, em si mesmo, é pobre e desprezível.
Cristo e o
crente ceiam juntos, o que no Oriente é uma indicação de especial amizade e de
uma aliança de comunhão. Noutras palavras, o crente tem uma abençoada comunhão
com seu Salvador e Senhor (Jo 14.23; 15.5; 1 Jo 2.24). Essa comunhão começa
aqui e agora, na presente vida. E aperfeiçoada na vida por vir quando o
vencedor se assentará com Cristo no seu trono, assim como Cristo, o Vencedor,
está assentado com seu Pai, em seu trono. O vencedor não somente reinará, mas
reinará com Cristo (Ap 20.4), na mais íntima comunhão com ele.
"Aquele
que tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas."
A condição
sétupla dessas igrejas existe, presentemente, ao mesmo tempo. Existe hoje. Tem
existido durante este período. Essas sete igrejas representam a Igreja toda
durante toda esta dispensação. E grandemente evidente que uma questão importante
seja esta: são essas igrejas fiéis à sua vocação? Apegam-se elas, firmes e
diligentes, no nome do Senhor no meio das trevas deste mundo (Ap 1.20)? Noutras
palavras, são elas candeeiros, portadoras de luz? Em Sardes e em
Laodicéia
o mundo parece ter triunfado. Vemos apenas uma tênue e bruxuleante chama; a luz
está quase - mas não totalmente - apagada. Em Éfeso a luz ainda brilha, mas a
chama está diminuindo. Em Pérgamo e em Tiatira, onde a tentação vinda da parte
do mundo era intensa, a luz brilha, mas não tão forte quanto deveria ser. Em
Esmirna e em Filadélfia, o verdadeiro caráter da Igreja como portadora da luz é
revelado e ali se pode encontrar fidelidade a Cristo; portanto, exerce sobre o
mundo uma influência benéfica. E essa Igreja uma portadora de luz? Essa é a
maior questão em todas as cartas do Apocalipse. Ela é fiel ao Senhor no meio do
mundo?
A tentação
de tornar-se mundana e de negar a Cristo vem de três direções.[4]
Primeiro, da parte da perseguição anticristã, a espada, as feras selvagens, a
fogueira, a prisão (2.10,13; 2.9; 3.9) e os judeus que constantemente acusavam
os cristãos diante das cortes romanas. Segundo, e intimamente relacionado ao
primeiro, da parte da religião romana, o culto ao imperador (2.13). A primeira
fonte de tentação não pode ser separada da segunda. Terceiro, há a tentação da
carne: o constante apelo a juntar-se às festas imorais dos
pagãos a
fim de assegurar a posição social e para usufruir os prazeres do mundo. E essa
forma de tentação se relaciona à segunda, a forma religiosa. A Igreja está no
mundo. Isso era verdade na época. Ela ainda está no mundo hoje. A Igreja deve
brilhar nas trevas.
"Vós
sois a luz do mundo - e os sete candeeiros são as sete igrejas."
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