terça-feira, 20 de dezembro de 2011

OS SETE CANDEEIROS - Apocalipse 2 e 3


Fonte: Mais Que Vencedores - William Hendriksen



O Apocalipse é uma obra de arte, arte maravilhosa, arte divi­na. Suas diversas partes são unidas por fios sutis. E impossível entender os capítulos 2 e 3 a menos que se tenha lido o capítulo 1. E os capítulos 2 e 3, por sua vez, formam o cenário para a última porção do livro. As promessas encontradas nesses dois capítulos são repetidas e explicadas, de modo mais completo, nessas últimas passagens.
Quer saber o que significam as palavras: "Ao vencedor dar-lhe-ei de comer da árvore da vida que se encontra no paraíso de Deus"? Então vá a Apocalipse 22.2,14. E também, se você está procurando uma definição para "segunda morte" na visão da gloriosa promessa: "o vencedor de modo nenhum sofrerá dano da segunda morte", Apocalipse 20.14 oferece exatamente o que você está buscando. O "novo nome" que é prometido aos "ven­cedores" (2.17) reaparece diversas vezes: 3.12; 14.1; 22.4; cf 19.12,13,16. A autoridade sobre as nações de 2.26 é comentada em 12.5; 20.4. A estrela da manhã de 2.28 ocorre em 22.16; e assim acontece com todas as demais promessas.[1] As sete cartas pertencem à própria essência do livro. O livro é uma unidade.
Essas sete cartas, sobretudo, revelam - com pequenas mo­dificações - um único padrão. Esse padrão aparece, mais clara­mente, nas cartas a Efésios, Pérgamo, Tiatira e Sardes. As sete partes são como se segue:

1. A saudação ou destinopor exemplo: "Ao anjo da Igreja em Efeso..."
2. A autodesignação de Cristo; por exemplo: "aquele que conserva na mão direita as sete estrelas..."
3. A aprovação da parte de Cristo; por exemplo: "Conheço as tuas obras, assim o teu labor como a tua perseverança..."
4. A condenação da parte de Cristo; por exemplo: "Tenho, porém, contra ti..."
5. A advertência e a ameaça da parte de Cristo; por exemplo: "Lembra-te, pois, de onde caíste... se não..."
6. A exortação da parte de Cristo; por exemplo: "Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas".
7. A promessa de Cristo; por exemplo: "Ao vencedor dar-lhe-ei de comer da árvore da vida..."

Em cada igreja - com a exceção única de Laodicéia -Cristo encontra algo recomendável. Em cinco das sete, ele en­contra algo condenável. As exceções louváveis são Esmirna e Filadélfia.
Essas sete cartas estão divididas em dois grupos: um de três e outro de quatro.[2] Nas primeiras três cartas a exortação é seguida pela promessa. Nas últimas quatro, essa ordem é invertida.
A idéia de que essas sete igrejas descrevem sete sucessivos períodos da História da Igreja nem precisa de refutação.[3] Para não dizer nada sobre a quase humorística - se não deplorável ­exegese, que, por exemplo, torna a Igreja morta de Sardes uma referência à era gloriosa da Reforma; deveria estar claro para qualquer estudante da Bíblia que não há em todo o escrito sacro qualquer átomo de evidência que corrobore esse método total­mente arbitrário de dividir a História da Igreja e atribuir as par­tes resultantes às respectivas cartas de Apocalipse 2 e 3.
As cartas descrevem condições que não ocorrem em qual­quer época em particular da História, mas que se repetem muitas vezes.

A CARTA À IGREJA DE LAODICÉIA - Ap 3.14-22


FONTE: Mais Que Vencedores - William Hendriksen

Laodicéia estava situada nas vizinhanças de águas termais. Emitir água quente da boca era uma figura que seus cidadãos podiam bem compreender. Uma famosa escola de medicina cresceu ali, produzindo, entre outras coisas, um remédio para olhos fracos. Nessa cidade, a macia lã negra das ovelhas do vale era tecida em peças de roupa. Laodicéia, porém, era mais conhecida por sua riqueza. Localizada na confluência de três grandes estradas - para certificar-se, consulte um mapa ela cresceu rapidamente e se transformou num grande centro fi­nanceiro e comercial. Era o lar de muitos milionários. Havia, é claro, teatros, um estádio e um ginásio equipado com ba­nhos. Era a cidade de banqueiros e financistas. Tão rica era essa cidade que seus habitantes declinaram receber ajuda do governo após a cidade ter sido parcialmente destruída por um terremoto.[1]
Os cidadãos de Laodicéia eram ricos - e sabiam disso! Eles eram insuportáveis. Mesmo as pessoas da Igreja demonstravam essa atitude orgulhosa, desafiadora e presunçosa. Talvez imagi­nassem que sua riqueza era sinal de algum favor especial de Deus. A certa altura eles começaram a pensai- que "tinham che­gado lá". Estavam imbuídos do espírito que dominava a cidade. Orgulham-se de suas riquezas espirituais.[2] Se os habitantes de Laodicéia tivessem dito o que pensavam, sua linguagem seria como se segue - ouçam atentamente a um desses insuportáveis jactanciosos que representa o resto deles: "Estou rico e abastado, e não preciso de cousa alguma" (verso 17).
E fácil ver que essas pessoas não eram perturbadas por qualquer consciência de pecado. Jamais pensariam em ficar distantes, com olhos tristes e cabeças tombadas, suspirando e dizendo: "O Deus, misericordioso para comigo, um peca­dor". Eles haviam "chegado lá"! Conforme seu próprio modo de pensar, não tinham necessidade de qualquer admoestação e podiam ser mornos quanto a qualquer exortação. "Morno" é a palavra. O povo de Laodicéia sabia exatamente o que isso signi­ficava. Morno, tépido, lasso, claudicante, tíbio, sempre pronto a se comprometer, indiferente, desatento: Uma atitude de "somos todos boa gente aqui em Laodicéia". O autor deste livro se tor­nou pessoalmente familiarizado com essa atitude da parte de alguns membros de Igreja. É impossível se fazer qualquer coisa por essa gente. Com os pagãos, quer dizer, com aqueles que nunca tiveram contacto com o evangelho e que, portanto, são "frios" quanto a ele, pode-se fazer alguma coisa. Com cristãos sinceros e humildes, pode-se trabalhar com alegria. Mas com esses "somos todos boa gente aqui em Laodicéia", nada há que possa ser feito. Até mesmo o próprio Cristo não pode suportá-los. Uma emoção, um sentimento é aqui atribuído ao Senhor que em nenhum outro lugar lhe é atribuído na Bíblia. Não le­mos que ele está ofendido com eles. Nem que ele está irado contra eles. Não, ele está enojado de tais indecisos. E não apenas levemente enjoado, mas totalmente nauseado. "Assim, porque és morno, e nem és quente nem frio, estou pronto a vomitar-te de minha boca." Sabendo muito bem que toda a sua religião é somente muita simulação e fingimento, muita hipocrisia, o Senhor se apresenta como o exatamente oposto: "Estas coisas diz a teste­munha fiel e verdadeira". Noutras palavras, o Senhor revela-se aqui como aquele cujos olhos não somente vêem exatamente o que se passa no coração dessa gente de Laodicéia, mas cujos lábios também declaram, exatamente, a verdade que vêem. Ele de­clara, sobretudo, que ele é "o princípio da criação de Deus", isto é, a fonte de toda a criação (çf. 21.6; 22.13; Jo 1.1; Cl 1.15-18). "Gente de Laodicéia, vocês precisam tornar-se novas criaturas: precisam de novos corações. Tornem-se a mim, portanto, para que sejam salvos."
Embora ele esteja totalmente enojado dessa igreja porque ela falha em seus deveres de portadora da luz, não obstante, há graça aqui: maravilhoso amor cheio de carinho e admoestação. Cristo, na verdade, não diz: "Irei vomitá-los de minha boca", mas: "Estou prestes a vomitar-te de minha boca". O Senhor ainda aguarda. Ele envia essas cartas a fim de retirá-los dessa mornidão espiritual. E, verdadeiramente, severo na sua condenação exa­tamente porque ele é manso e carinhoso, amoroso e gracioso.
A essa congregação, e, portanto, ao seu membro típico, o Senhor diz: "...pois dizes: Estou rico e abastado, e não preciso de cousa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu". Deve-se notar que não é "miserável", mas lastimável. Quem é mais lastimável do que um indivíduo que imagina ser um bom cristão, quando, na realidade, o próprio Cristo está sumamente enojado dele? Leia essas palavras len­tamente e tente ver a figura de um indivíduo que tenha estas cinco características combinadas: vileza, mesquinhez, bajulação servil, cegueira e nudez!
"Aconselho-te." Quão suave ele fala - não "ordeno-te", mas "aconselho-te". Cristo aconselha essa igreja a comprar dele - o "de mim" é bastante enfático - ouro refinado pelo fogo, vestes brancas e colírio. Em poucas palavras: "compre salva­ção", pois a salvação é ouro que enriquece (2 Co 8.9); é veste branca que cobre a nudez ou nossa culpa e reveste-nos com justiça, santidade e alegria no Senhor; é colírio que, quando possuído, não mais nos deixa cegos. A salvação tem de ser com­prada, isto é, precisamos obter a justa posse dela. Mas como podem, aqueles que são pobres, e tudo o mais, comprar qual­quer coisa? Leia Isaías 55.1ss. e você terá uma resposta!
Há algo mais maravilhoso em toda a Bíblia do que isso, que a essa gente morna com que o Senhor está tão desgostoso a ponto de vomitá-los de sua boca, ele se dirija com estas palavras: "Eu repre­endo e disciplino a quantos amo. Sê, pois, zeloso e arrepende-te. Eis que estou à porta e bato..."
Observe que o Senhor está instando para que a porta seja aberta. Não apenas isso, mas - como fica evidente no próximo verso - ele mesmo é quem está batendo repetidas vezes e cha­mando o pecador. Note a frase "se alguém ouvir a minha voz". Não é a pessoa no interior que toma a iniciativa. Não, esse texto está em total harmonia com a Bíblia toda nos ensinamentos concernentes à graça soberana. É o Senhor que está à porta, ou contra a porta - ninguém o chamou - batendo, não uma, mas repetidas vezes: é ele quem chama, e sua voz no evangelho aplicado ao coração pelo Espírito é o poder de Deus para a salvação. Dessa forma, essa passagem faz justiça tanto à graça divina soberana quanto à responsabilidade humana.[3]
"Se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele comigo." Observe que ele diz "se alguém..."; o Senhor dirige-se a indivíduos. A salvação é uma coisa muito pessoal; quando o coração é aberto pela voz do Senhor, esse princípio de regeneração se torna ativo para que, pelo Espírito Santo, o indivíduo regenerado abra a porta e receba a Cristo. O abrir da porta é o que, geralmente, é chamado de conversão. Não confunda regeneração (Jo 3.3ss.; At 16.4) com conversão. Aqui, na expressão: "Se alguém abrir a porta", a referência é feita à conversão, ao arrependimento e à fé em Cristo, como o contexto claramente indica. O Senhor entra (Jo 14.23). Que maravilha! Ele desce do trono de sua glória a fim de cear com esse indivíduo que, em si mesmo, é pobre e desprezível.
Cristo e o crente ceiam juntos, o que no Oriente é uma indicação de especial amizade e de uma aliança de comunhão. Noutras palavras, o crente tem uma abençoada comunhão com seu Salvador e Se­nhor (Jo 14.23; 15.5; 1 Jo 2.24). Essa comunhão começa aqui e agora, na presente vida. E aperfeiçoada na vida por vir quando o vencedor se assentará com Cristo no seu trono, assim como Cristo, o Vencedor, está assentado com seu Pai, em seu trono. O vencedor não somente reinará, mas reinará com Cristo (Ap 20.4), na mais íntima comunhão com ele.
"Aquele que tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas."
A condição sétupla dessas igrejas existe, presentemente, ao mesmo tempo. Existe hoje. Tem existido durante este perío­do. Essas sete igrejas representam a Igreja toda durante toda esta dispensação. E grandemente evidente que uma questão im­portante seja esta: são essas igrejas fiéis à sua vocação? Apegam-se elas, firmes e diligentes, no nome do Senhor no meio das trevas deste mundo (Ap 1.20)? Noutras palavras, são elas candeeiros, portadoras de luz? Em Sardes e em Laodicéia o mundo parece ter triunfado. Vemos apenas uma tênue e bruxuleante chama; a luz está quase - mas não totalmente - apagada. Em Éfeso a luz ainda brilha, mas a chama está diminuindo. Em Pérgamo e em Tiatira, onde a tentação vinda da parte do mundo era intensa, a luz brilha, mas não tão forte quanto deveria ser. Em Esmirna e em Filadélfia, o verdadeiro caráter da Igreja como portadora da luz é revelado e ali se pode encontrar fidelidade a Cristo; portanto, exerce sobre o mundo uma influência benéfica. E essa Igreja uma portadora de luz? Essa é a maior questão em todas as cartas do Apocalipse. Ela é fiel ao Senhor no meio do mundo?
A tentação de tornar-se mundana e de negar a Cristo vem de três direções.[4] Primeiro, da parte da perseguição anticristã, a espada, as feras selvagens, a fogueira, a prisão (2.10,13; 2.9; 3.9) e os judeus que constantemente acusavam os cristãos diante das cortes romanas. Segundo, e intimamente relacionado ao primei­ro, da parte da religião romana, o culto ao imperador (2.13). A primeira fonte de tentação não pode ser separada da segunda. Terceiro, há a tentação da carne: o constante apelo a juntar-se às festas imorais dos pagãos a fim de assegurar a posição social e para usufruir os prazeres do mundo. E essa forma de tentação se relaciona à segunda, a forma religiosa. A Igreja está no mundo. Isso era verdade na época. Ela ainda está no mundo hoje. A Igreja deve brilhar nas trevas.
"Vós sois a luz do mundo - e os sete candeeiros são as sete igrejas."


[1]Ibid., pp. 413-423. Ver também W. J. McKnigth, art. já citado, pp. 5l9ss.
[2]E ponto de vista mantido por quase todos os comentaristas que eles se jactavam de sua riqueza espiritual e não, primariamente, de suas posses materiais. W. Milligan, contudo, defende um ponto de vista oposto.
[3]É claro que o homem, não Deus, é aqui representado abrindo a porta. O homem se
arrepende. A abertura da porta, então, refere-se à conversão, e não pode se referir à regeneração, a qual é totalmente uma obra de Deus. Na conversão, o homem tem parte ativa.

A CARTA À IGREJA DE FILADÉLFIA - Ap 3.7-13


FONTE: Mais Que Vencedores - William Hendriksen

Esta cidade estava situada num vale, numa estrada impor­tante. Derivou seu nome de Átala II, 159-138 A.C., cuja lealdade ao seu innão Eumenes conquistou-lhe o epíteto de "irmão-amante". Foi fundada com a intenção de ser um centro para difusão da língua e costumes gregos na Lídia e na Frigia e, assim, desde o princípio foi uma cidade missionária, e muito bem-sucedida no seu propósito.[1]
A essa Igreja Cristo refere-se a si mesmo como aquele que é santo e verdadeiro. A pretensão dos falsos ou não-autênticos- isto é, descrentes - judeus não agrada a ele. Cristo somente tem "a chave de Davi", isto é, o mais alto poder e autoridade no reino de Deus (cf Is 22.22; Mt 16.19; 28.18; Ap 5.5). Cristo sabe que, embora sua Igreja tenha pouco poder por ser pequena em número e em riqueza, tem permanecido leal ao evangelho e não negou o nome do seu Senhor.
"...Eis que tenho posto diante de ti uma porta aberta a qual ninguém pode fechar." A porta aberta significa, primeiro, uma oportunidade maravilhosa de pregar o evangelho e, segundo, a operação da graça de Deus criando ouvidos para ouvir, ansiosos para recebê-lo (cf. 2 Co 2.12; Cl 4.3; At 14.27). A Igreja de Filadélfia, ainda que pequena aos olhos humanos, era grande aos olhos do Senhor. Enfrentando o escárnio e as acusações dos judeus, ela guardou a palavra da perseverança de Cristo, o que, provavelmente, significa o evangelho da cruz na qual a perseverança do Senhor ficou patente. Ela já recebeu em juízo a coroa da vitória e agora é instada a conservá-la. Note como a proteção divina - "também eu te guardarei" - e o empenho humano - "Conserva o que tens"- vão lado a lado. Uma quá­drupla recompensa gloriosa é prometida a essa Igreja que exibe de maneiras tão adequadas o que significa ser um candeeiro.
Primeiro, enfrentando os acusadores e escarnecedores ju­deus ela não apenas prevaleceu - como Esmirna - mas con­quistará a vitória que o vencedor participará por meio de sua conversão! Segundo, ela será guardada segura através da hora da tribulação (cf Is. 43.2; Mc 13.20). Terceiro, os vencedores serão "pilares" do templo de Deus. Um pilar é algo permanente. Eles obtêm aquilo que Davi desejou (SI 27.4). Nenhum terre­moto os encherá de medo ou os levará para fora da cidade celestial. Eles habitarão nela. Finalmente, Cristo escreverá sobre o vencedor o nome de seu Deus e o nome da cidade do seu Deus, a nova Jerusalém ... e seu próprio novo nome. Em outras palavras, ao vencedor será dada a segurança de que pertence a Deus e à nova Jerusalém, e a Cristo, e de que participará, eter­namente, de todas as bênçãos desses três. Para uma explicação da frase "que desce do céu, vinda da parte do meu Deus".

[1]Ver W. M. Ramsay, op. cit., pp. 391-400.

A CARTA À IGREJA DE SARDES - Ap 3.1-6


FONTE:  Mais Que Vencedores - William Hendriksen

Sardes, a inconquistável, estava situada sobre um mon­te quase inacessível, mirando o vale Herma, e, nos tempos antigos, a suntuosa capital da Lídia. Seu povo era arrogante, confiante em si mesmo. Eles estavam certos - muito certos, até! - de que ninguém poderia escalar aquele monte com suas encostas perpendiculares. Havia um único ponto de acesso: um estreito corredor na direção do sul que poderia ser facilmente fortificado. Mas o inimigo veio, em 549 A.C. e de novo em 218 A.C. e... tomou Sardes. Um ponto despercebido, desguardado e fraco, uma rachadura oblíqua na encosta de pedra, uma única chance em mil de um ataque noturno realizado por hábeis escaladores, era tudo o que foi preciso para causar uma ruptura na arrogância dos presunçosos cidadãos dessa orgulhosa capi­tal. O monte sobre o qual Sardes era erigida tornou-se muito pequeno para uma cidade crescente. Assim, a Sardes antiga, a acrópole, começou a ficar deserta e uma nova cidade surgiu nas vizinhanças. Quando o Apocalipse foi escrito, Sardes estava en­frentando a decadência, uma morte lenta, mas certa.[1] No ano 17 A.D. a cidade foi parcialmente destruída por um terremoto. Dessa forma, diversas vezes os independentes e jactanciosos habitantes de Sardes viram a destruição chegar "como o ladrão de noite", de modo súbito e inesperado.
Sardes estava naufragando num estupor espiritual. Isso explica a auto-designação de Cristo: "Aquele que tem os sete -viventes- espíritos". Ele tem, também, em sua mão direita as sete estrelas. Por meio dos ministros da Palavra e sua mensa­gem, os espíritos viventes são capazes de reviver uma Igreja morta.
"Conheço as tuas obras, que tens nome de que vives, e es­tás morto." Sardes gozava de boa reputação, mas não merecia essa reputação. Onde em Pérgamo e Tiatira um pequeno grupo da congregação havia caído na tentação do mundo, em Sardes a congregação toda havia "contaminado as suas vestiduras". Sardes também estava no mundo. Deveria ter sido um can­deeiro. Mas falhou no cumprimento do seu dever. Nem os ju­deus nem os gentios parecem ter atribulado o povo de Sardes. Sardes era uma Igreja "pacífica". Gozava paz, mas a paz de um cemitério! Cristo diz a esses membros de Igreja mortos que de­vem despertar e manterem-se acordados, e fortalecer o resto que estava à beira da morte. A luz no candeeiro está ficando cada vez mais fraca. Breve a pequena chama estará completa­mente apagada.
"...Não tenho achado íntegras as tuas obras na presença do meu Deus." As formas estavam ali, as cerimônias, os costumes religiosos, as tradições, os cultos; mas faltava a essência real. As formas estavam vazias. Eles não estavam plenamente cheios com a essência. Fé, esperança e amor, genuínos e sinceros, esta­vam em falta. A realidade se fora. À vista dos homens, Sardes pode ser vista como uma Igreja esplêndida. "Diante de Deus", porém, era uma Igreja morta. Por isso o povo de Sardes deveria lembrar seu passado. Haviam recebido o evangelho com ardor e sinceridade; que voltassem a uma vida de obediência ao evan­gelho da maneira como lhes foi pregado e do modo como seus pais o haviam recebido.[2]
"Porquanto, se não vigiares, virei como um ladrão, e não conhecerás de modo algum em que hora virei contra ti" (ver Mt 24.43). Sardes certamente sabia o que isso significava.
"Tens, contudo, em Sardes, umas poucas pessoas que não contaminaram as suas vestiduras, e andarão de branco junto comigo, pois são dignas." "Umas poucas pessoas" - essas pessoas eram conhecidas nominalmente pelo Pai no céu. Eram conhecidas individualmente, cada uma separadamente. Deus sa­bia exatamente quem e o que eram. Ele conhece os que são seus. Eles eram como luz brilhando no meio das trevas do mun­do. Esses poucos, que aqui guardaram imaculadas as vestes da graça, iriam logo ser revestidos das brancas vestes da glória. Branco indica santidade, pureza, perfeição e festa (Is 61.10; Ap 19.8).
Quando os cidadãos terrenos morrem, seus nomes são apagados dos livros; os nomes dos vencedores espirituais ja­mais serão apagados; sua vida gloriosa perdurará. O próprio Cristo publicamente os reconheceria como seus . Ele faria isso diante do Pai e diante dos seus anjos (cf. Mt 10.32; Lc 12.8,9).


H.lbid., pp. 354-368.
[2]Cf. especialmente a carta a Éfeso, pp. 89s.

A CARTA À IGREJA DE TIATIRA - Ap 2.18-29

FONTE: Mais Que Vencedores - William Hendriksen

Esse lugar está situado num vale que conectava dois outros vales. Sem fortificações naturais e estando aberta a ataque e invasão, uma guarnição estava, geralmente, estacionada ali não só para proteger a cidade, mas para obstruir aos inimigos o cami­nho para Pérgamo, a capital. Sendo um centro de comunicação, com muitas pessoas passando por ela, Tiatira se tornou uma cidade de comércio. Ali se achavam as associações de negó­cios: artesanato de lã, de linho, de capas, tingimento de panos, artesanato de couro, curtidores, oleiros, etc.26 Ali esses negócios se associavam com o culto de deidades patronais: cada negócio tinha seu deus guardião. A situação, portanto, era mais ou me­nos como se segue: se você deseja se dar bem neste mundo, precisa pertencer a uma associação; se você pertence a uma associação, sua própria adesão implica o culto ao seu deus. Espe­ra-se de você que atenda às festas da associação e que coma parte do que foi oferecido à deidade patronal, como um pre­sente dessa mesma deidade. Então, quando termina a festa, e o verdadeiro - totalmente imoral - divertimento começa, você não deve sair a menos que queria se tornar objeto de ridículo e de perseguição!
O que deve um cristão fazer numa situação tão difícil? Se ele deixa a associação, perde sua posição e participação na sociedade. Talvez tenha que sofrer necessidade, fome e perse­guição. Por outro lado, se ele permanece na associação e atende às suas festas imorais, comendo coisas sacrificadas a ídolos e cometendo o pecado de fornicação, ele nega o seu Senhor.
Nessa difícil situação, a profetiza Jezabel fingia conhecer a verdadeira solução do problema, o caminho para fora da difi­culdade. Ela, aparentemente, argumentava assim: para vencer Satanás, você precisa conhecê-lo. Você jamais será capaz de vencer o pecado a menos que se torne experimentalmente fami­liarizado com ele. Resumindo, um cristão deveria aprender "as cousas profundas de Satanás". Atendendo, de qualquer forma, às festas das associações e cometendo fornicação... e ainda per­manecendo um cristão; tornando-se, até, um melhor cristão!
Se, porém, membros de Igreja persuadem-se de que esse rumo é certo, não podem, no entanto, enganar aquele que tem olhos como que de fogo e pés prontos a pisar o iníquo. O Senhor louva aquilo que é digno de recomendação: obras, amor, fé, serviço - serviço de amor para com os irmãos - e perseverança. Ele os louva também "as tuas últimas obras, mais numerosas do que as primeiras". Quanto a tudo isso, a Igreja de Tiatira era, na verdade, um candeeiro, um candelabro. Mas isso não constitui uma desculpa para a falha em exercitar a disciplina quanto a um membro que se compromete com o mundo. Assim, nós lemos: "Tenho, porém, contra ti o tolerares essa mulher" - não uma esposa - "Jezabel". Seu nome é sinônimo de sedução à idolatria e à imoralidade (1 Rs 16.31; 18.4,13,19; 19.1,2). Se essa mulher "Jezabel" continua impenitente - quão gracioso é o Senhor que lhe dá tempo para se arrepender! - ela será pros­trada na cama, isto é, acometida de enfermidade; seus filhos naturais morrerão de morte violenta e seus seguidores espiri­tuais sofrerão punição. Assim toda a Igreja saberá que Cristo é quem sonda as mentes e os corações. Seus olhos penetrantes vêm os motivos escondidos que fazem as pessoas seguir Jezabel, a saber, falta de disposição para sofrer perseguição por amor de Cristo.
Sobre aqueles que permanecem fiéis, Cristo não impõe mais responsabilidade (cf At 15.28,29). Em sua relação com o mun­do eles devem cuidar que não haja fornicação e evitar comer coisas sacrificadas aos ídolos.
Logo as coisas serão mudadas. No presente, o mundo opri­me os membros da Igreja que desejam guardar a consciência limpa. Mas, depois, o membro da Igreja que permanecer leal a seu Senhor reinará sobre o mundo e, estando associado com Cristo no julgamento final, condenará os pecadores. Ele parti­cipará do domínio de Cristo sobre as nações - que Cristo, por sua vez, recebeu do Pai (SI 2.8,9); e no dia do juízo final o ímpio será reduzido a pedaços. Os oleiros de Tiatira estavam aptos a entender esse símbolo.
"Dar-lhe-ei ainda a estrela da manhã." Aqui, novamente, a referência primária é ao próprio Cristo (Ap. 22.16). Assim como a estrela da manhã reina nos céus, assim os crentes reinarão com Cristo; compartilharão do seu domínio e esplendor reais. A estrela é sempre símbolo de realeza, estando ligada ao cetro (Nm 24.17; cf. Mt 2.2).

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A CARTA À IGREJA DE PÉRGAMO - Ap 2.12-17


FONTE: Mais Que Vencedores - William Hendriksen

Esta cidade estava localizada sobre uma grande montanha de rocha tendo aos seus pés um grande vale circunvizinho. Os romanos a fizeram capital da província da Ásia. Aí, Esculápio, o deus da cura, era cultuado sob o emblema da serpente que, para os cristãos, era o próprio símbolo de Satanás. Nessa cidade se encontrava, entre os muitos altares pagãos, o grande altar de Zeus.[1] Todas essas coisas deveriam estar na cabeça de Cristo quando ele chamou Pérgamo de o lugar "onde está o trono de Satanás". Entretanto, parece-nos que o propósito óbvio do au­tor é dirigir nossa atenção para o fato de que Pérgamo era a capital da província e, como tal, centro do culto ao imperador.
Ali o governador era louvado, e ali os templos pagãos eram dedicados ao culto de César. Ali era exigido dos crentes que oferecessem incenso à imagem dos imperadores e que dissessem "César é Senhor". Aí Satanás tinha seu trono; ali ele reinava livremente. "Estas coisas diz aquele que tem a espada afiada de dois gumes." De novo, a autodesignação está em harmonia com o tom geral da carta. Aqui se diz que Cristo tem a espada de dois gumes porque ele fará guerra contra os nicolaítas, a menos que se arrependam (v. 16).
A despeito, porém, do fato de que o trono de Satanás esti­vesse localizado ali, e do fato de que ali Antipas tivesse mandado matar os crentes que se recusaram ser infiéis ao Senhor, os cren­tes de Pérgamo ainda se atinham tenazmente à sua confissão, ao seu Cristo.
Eles, entretanto, cometeram um grande erro, provavel­mente devido ao fato de terem enfatizado sua salvação indi­vidual à custa do dever cristão de se preocupar com o bem-estar da Igreja como um todo: eles negligenciaram a disci­plina.[2] Alguns dos membros da Igreja haviam atendido a festivais pagãos e haviam, com toda probabilidade, até mes­mo participado das imoralidade que caracterizavam essas festas. Semelhantes práticas haviam ocorrido entre os filhos de Israel nos dias de Balaão (Nm 25.1,2; 31.16). Como Israel, também, Pérgamo teve seus nicolaítas. Não devemos fazer pouco dessa tentação. Recusar-se a comer carnes sacrificadas aos ídolos e, especialmente, recusar-se a freqüentar essas festas significava retirar-se de grande parte de toda a vida social daquele tempo pela razão de que o comércio tinha como patronos as deidades que deveriam ser cultuadas nessas fes­tas. A recusa em participar dessas festas geralmente signifi­cava que um homem perderia seu emprego, seu comércio; ele seria considerado um excluído.[3] Assim, algumas pessoascomeçaram a argumentar que, afinal, alguém poderia freqüen­tar tais festivais e partilhar das carnes oferecidas aos ídolos, e, talvez, oferecer incenso aos ídolos pagãos, desde que man­tivesse sempre em mente - um tipo de reserva mental - que um ídolo nada significa! Outros levavam essa linha de ra­ciocínio ainda mais longe e diziam: "Como pode alguém condenar e vencer Satanás a menos que o conheça plena­mente?"
A Igreja de Pérgamo não estava totalmente cônscia dos perigos de sua atitude comprometedora, essa meia-aliança com o mundo. Ela deveria ter disciplinado seus membros faltosos. Se falha em fazê-lo, Cristo irá à guerra contra ela com a espada de sua boca. Não cremos que isso se refira tão-somente a uma condenação verbal. A condenação verbal está contida nessa carta. Antes, significa destruição: Cristo irá destruir aqueles que persistem em suas práticas mundanas - Ele levará a cabo sua sentença de condenação.
O vencedor, por outro lado, receberá "do maná escondi­do", isto é, Cristo em toda a sua plenitude (Jo 6.33,35), escon­dido do mundo, mas revelado aos crentes já aqui na terra e, especialmente, no porvir. Noutras palavras, esses vencedores que dominaram a tentação de participar dos festivais pagãos e de comer carne sacrificada aos ídolos, serão alimentados do próprio Senhor; a graça de Cristo e todos os seus gloriosos frutos serão sua comida, invisível, espiritual, e escondida, certamente, mas, no entanto, muito real e muito abençoada. Eles recebem o pão do céu.[4]
"...Bem como darei uma pedrinha branca e sobre essa pe­drinha escrito um nome novo, o qual ninguém conhece, exceto aquele que o recebe." Os comentaristas estão grandemente di­vididos em suas opiniões com respeito ao significado dessas palavras. Depois de extenso estudo, chegamos à conclusão que só há duas interpretações que merecem considerações sérias. Todas as outras são objetáveis logo de princípio.[5]
Cada uma das duas teorias restantes tem tanto mais a seu favor que nos tem sido impossível tomar uma decisão definitiva. Portanto, colocaremos aqui as teorias e os argumentos que as suportam, e dei­xaremos para o leitor a escolha, ou permanecer indeciso.
Conforme a primeira interpretação, a pedra representa a pessoa que a recebe, tal como em Israel as doze tribos eram representadas por doze pedras preciosas no peitoral do sumo sacerdote (Êx. 28.15-21). Agora essa pedra é branca. Isso indica santidade, beleza, glória (Ap 3.4; 6.2). A própria pedra simboli­za durabilidade, imperecibilidade. A pedra branca, portanto, indica um ser livre de culpa e purificado de seu pecado, que permanece nesse estado para sempre. O novo nome inscrito na pedra indica a pessoa que a recebe. Expressa o caráter interior real da pessoa; sua personalidade individual, distinta. Cada um dos abençoados deve ter uma consciência particular e singular dessa personalidade: um conhecimento dado a ninguém mais senão àquele que o recebe.[6]
Os seguintes argumentos podem ser apresentados em fa­vor dessa teoria:
a. As palavras "o qual ninguém conhece, exceto aquele que o recebe", deve significar "o qual ninguém conhece senão aquele que recebe o nome", não a pedra. O próprio crente recebe esse nome e este deve ser seu novo nome. Isso está em completa harmonia com Apocalipse 19.12, onde lemos isto com respeito a Cristo: "tem um nome escrito que ninguém conhece senão ele mesmo". O nome, então, indica a pessoa que o recebe.
b. Se esse nome indicasse o nome de Deus ou de Cristo, isso teria sido declarado como em outros casos (por exemplo: 3.12; 14.1; 22.4).
c. Essa explicação se baseia na firme fundação de passa­gens paralelas do Antigo Testamento, como, por exemplo:
"...e serás chamada por um nome novo que a boca do Senhor designará" (Is 62.2).
"...e a seus servos chamará por outro nome" (Is 65.15).
d. Conforme a Escritura, o nome indica o caráter ou a posi­ção do portador. Nessa base, muito freqüentemente, a pessoa cujo caráter é mudado recebe um novo nome que corresponde a ele. Na glória, nós receberemos uma nova santidade, uma nova visão, etc. Portanto, receberemos um novo nome.
De acordo com a segunda interpretação, a pedra preciosa translúcida - um diamante? - tem inscrito o nome de Cristo. Receber a pedra com o novo nome significa que a glória do vencedor recebe a revelação da doce comunhão com Cristo -em seu novo caráter, como Mediador coroado - uma comunhão que só quem a recebe pode apreciar.[7]
Em favor dessa explicação, os seguintes argumentos são oferecidos:
a. Em todas as outras passagens do Apocalipse, sem qual­quer exceção, o novo nome se refere a Deus ou a Cristo. Esse nome é dito como estando escrito na fronte dos crentes (3.12; 14.1; 22.4).
b. O ponto de vista de que esse nome se refere a Cristo é apoiado tanto pelo contexto precedente quanto pelo posterior: o maná escondido se refere ao que Cristo é para o crente; sobre­tudo, nesta mesma série de cartas encontramos uma passagem paralela (3.12) em que o nome, embora escrito no crente, é de­finido como pertencente a Cristo.
c. Assumir que a expressão "o qual ninguém conhece, exceto aquele que o recebe" significa "aquele que recebe o nome", não prova que o nome seja a nova designação do pró­prio crente. Pode-se tanto dizer que o crente recebe o nome de Cristo quanto dizer que o nome de Cristo é inscrito na sua (do crente) fronte. É interessante observar, quanto a isso, que os não-crentes recebem, do diabo, a imitação do novo nome. Deles se diz que "receberam a marca na fronte e na mão" (Ap 20.4) tal como os crentes recebem o nome de Cristo na fronte (14.1). Essa "marca", porém, indica "outro", isto é, a besta. Essa é a marca da besta que os não-crentes recebem. Semelhantemente, na linguagem presente (2.17) os crentes recebem o nome de Cristo, isto é, seu nome é escrito na fronte no mesmo sentido que em d.
d. Essa idéia está em harmonia com o simbolismo do Antigo Testamento, o qual está embutido nas diversas passagens do Apocalipse. Na fronte do sumo sacerdote - para ser exato, na frente da mitra - estava escrito um nome. Não era o nome do sumo sacerdote, mas de Jeová. Esse nome designava o sumo sacerdote como servo consagrado de Jeová, como pertencente a Ele. Assim lemos: "Farás também uma lâmina de ouro puro, e nela gravarás à maneira de gravuras de sinetes: Santidade ao Senhor. Atá-la-ás com um cordão de estofo azul, de maneira que esteja na mitra; bem na frente da mitra estará. E estará so­bre a testa de Arão..." (Êx 28.36ss.).
O significado, então, é como se segue. Assim como na an­tiga dispensação o nome de Jeová estava escrito na fronte do sumo sacerdote para indicar que ele era especialmente consa­grado como servo de Jeová, assim os crentes - freqüentemente chamados sacerdotes no Apocalipse - terão um novo nome es­crito na fronte, a saber, o nome de Cristo, seu novo nome. Esse nome não é escrito sobre uma placa de ouro puro, mas, ainda melhor, sobre uma translúcida pedra preciosa. Isso indica que o vencedor pertence a Cristo, é seu servo, se regozija em sua co­munhão, na sua nova glória e domínio. Sobretudo, assim como na antiga dispensação só o sumo sacerdote havia recebido os segredos quanto ao nome de Jeová e só ele sabia como pronunciá-lo, assim na nova dispensação só o crente sabe o significado abençoado do nome do Senhor Jesus Cristo. Eles -e só eles - sabem o significado na comunhão com ele. Em prin­cípio, eles já sabem isso aqui sobre a terra; mas uma revelação a mais sobre o significado desse nome lhes está reservada nos céus onde, para sempre, aqueles que foram selados na fronte com o selo do Deus vivo serão designados como o próprio Cristo. Eles recebem seu nome, isto é, seu novo nome na fronte.
Não exageremos a diferença entre esses dois pontos de vista. Na primeira interpretação, o crente recebe um novo nome, isto é, uma nova relação com o seu Salvador, revelada num glorioso caráter transformado. Na segunda interpretação, Cristo revela seu novo nome ao crente, especialmente no porvir. Deveríamos perguntar, portanto: "o novo nome de Cristo - que ele certa­mente recebeu - não implica o novo nome do crente - que, de novo, ele certamente receberá?"


[1]W. M. Ramsay. op. cit., pp. 281-290.
[2]Ver W. Milligan, op.cit., p. 846.
[3]Ver p. 102s.
[4]Ver W. Milligan, op. cit.,p. 846.
[5]As seguintes interpretações estão entre as que não podemos aceitar:
a. Que a pedra branca do Apocalipse é uma tessela usada como tíquete de admissão na festa do Grande Rei. Ver E. H. Plumptre, op. cit., pp. 127ss. para ver uma hábil defesa dessa idéia, Uma excelente refutação dessa teoria é encontrada num artigo de M. Stuart, "The White Stone of the Apocalypse", em Bibliotheca Sacra, O, pp. 461-477.
b. M. Stuart, no artigo mencionado, refuta igualmente o ponto de vista de que a pedra branca representa a pedra de absolvição usada em cortes de justiça.
c. Que a pedra branca com o nome inscrito se refere ao Urim e Tumim do Antigo Testamento. Isso é habilmente argumentado por R. C. Trench, op. cit, pp. 132ss. e A. Plummer (op. cit., p. 62) julga-a uma idéia muito atraente. Mas ela não pode estar correta. O argumento de Plumptre (op. cit., pp. 126ss.) contra essa teoria é decisivo.
d. R. H. Charles, Revelation (International Critical Commentary), pp. 66ss., ar­gumenta que a verdadeira fonte do símbolo se encontra na esfera da superstição popular. Isso nem precisa de resposta. Uma diversidade de outras explicações pode ser encontrada no The Speaker's Commentary; art. "Stones" no Dictionary of the Bible, de Smith, e em outros lugares.
[6]Esse ponto de vista (o mais popular deles), é defendido, com variações, por J. P. Lange, op. cit., p. 120, que, entretanto, vê a pedra branca como indicando absolvi­ção; por R. C. H. Lenski, op. cit., p. 113, e muitos outros.
26. W. M. Ramsay, op. cit., pp. 316-326.
[7]Para uma defesa dessa interpretação, ver M. Stuart, "The White Stone of the Apocalypse", Bibliotheca Sacra, O, op. cit., pp. 461-477.

domingo, 18 de dezembro de 2011

A CARTA À IGREJA DE ESMIRNA - Ap 2.8-11


Fonte: Mais Que Vencedores - William Hendriksen

Esta cidade, localizada num braço do mar Egeu, era uma rival de Éfeso. Dizia-se que era a "primeira cidade da Ásia em beleza e tamanho". Uma cidade pitoresca, numa encosta sobre o mar, com seus esplêndidos edifícios públicos no topo arre­dondado do monte Pagos, formavam o que era conhecido como "a coroa de Esmirna". A brisa do oeste, o zefir, vem do mar e sopra por cada parte da cidade tornando-a arejada e fresca, mes­mo durante o verão. Desde o início da subida de Roma ao poder, mesmo antes dos dias de sua grandeza, Esmirna era arredondado como leal aliada de Roma. Essa fidelidade e lealda­de se tornou proverbial.12
Com toda a probabilidade, a Igreja de Esmirna foi fundada por Paulo durante sua terceira viagem, em 53-56 A.D. Não estamos certos disso, mas parece-nos uma conclusão segura do que lemos em Atos 19.10: "...dando ensejo a que todos os habi­tantes da Ásia ouvissem a palavra do Senhor, tanto judeus como gregos".
É possível que Policarpo tenha sido bispo da Igreja em Esmirna nessa época. Ele foi discípulo de João. Fiel até a mor­te, esse venerável líder foi queimado na fogueira no ano 155 A.D. Foi-lhe ordenado dizer: "César é Senhor", mas ele se recu­sou. Levado ao estádio, o procônsul instou com ele: "Impropera a Cristo; nega-o e eu o porei em liberdade". A isso Policarpo respondeu: "Por 86 anos eu o tenho servido e ele jamais me causou qualquer mal: como, pois, eu poderia blasfemar contra meu Rei e meu Salvador?" Quando o procônsul novamente o pressionou, o velho homem respondeu: "Visto que em vão instas que ... jure pela prosperidade de César e ignore não conhecer quem sou e o que sou, declaro aqui com ousadia, que sou cris­tão..." Pouco depois o procônsul disse: "Tenho feras selvagens à minha disposição; e eu o lançarei às feras caso não te arrepen­das. Eu o farei ser consumido pelo fogo uma vez que desprezas as feras, se não te arrependeres". Mas Policarpo disse: "Ameaças-me com o fogo que pode durar por uma hora e, então, se extingue, mas ignoras o fogo do julgamento vindouro e a puni­ção eterna reservada para os ímpios. Por que demoras? Faça sua vontade". Logo depois o povo ajuntou madeira e palha; os judeus, especialmente, segundo o costume, avidamente os aju­davam. E Policarpo foi queimado na fogueira.[1]
Incluímos, propositalmente, esse breve relato do martírio de Policarpo para que o leitor tenha conhecimento das reais condições em que vivia a Igreja nos séculos 1Q e 2- A.D.
E a essa Igreja que Jesus se dirige, como se segue: "Estas coisas diz o primeiro e o último, que esteve morto e tornou a viver",[2] isto é, aquele que estava vivo mesmo quando morto: o que vive eternamente. Como no início das outras cartas, assim aqui: a autodesignação de Cristo se encontra em bela harmonia com o caráter geral da mensagem. Cristo, o vencedor da morte, o que vive eternamente, está apto a dizer, como o faz nesta car­ta: "Sê fiel até a morte e dar-te-ei a coroa da vida" (2.10).
"Conheço a tua tribulação, a tua pobreza." Extrema po­breza, é o que ele quer dizer. Aquelas pessoas eram, freqüen­temente, despedidas de seus empregos como resultado de sua conversão. Na verdade, diga-se logo que eram, geralmente, pobres quanto a bens terrenos. Tornar-se cristão era, de um ponto de vista terreno, um verdadeiro sacrifício. Isso signifi­cava pobreza, fome, prisão e, com freqüência, morte por meio de feras ou de fogo.[3]
O Senhor diz a esses crentes de Esmirna que não deviam sentir piedade de si mesmos. Podiam parecer pobres, mas, na realidade, eram ricos, a saber, de bens espirituais, ricos da gra­ça e de seus gloriosos frutos (Mt 6.20; 19.21; Lc 12.21). Que conforto para aqueles crentes perseguidos era o entendimento de que seu Senhor "sabia" disso tudo.
"...E a blasfêmia daqueles que se declaram judeus e não são, sendo antes sinagoga de Satanás." Esses judeus haviam escolhido Esmirna como local de sua residência provavelmente porque era uma cidade de comércio. Eles não só vilipendiavam o Messias, mas ansiosamente acusavam os cristãos diante dos tribunais romanos. Como sempre, eles se enchiam de maldade contra os cristãos (cf At 13.50; 14.2, 5, 19; 17.5; 24.1). Esses pretensos judeus podiam considerar-se "sinagoga de Deus", mas eram, na verdade, "sinagoga de Satanás", o principal acusador da irmandade. Como qualquer um pode dizer que os judeus de hoje são ainda, num sentido especial, glorioso e preeminente, o povo de Deus, é algo além do que eu posso entender. O próprio Deus chama aqueles que rejeitam o Salvador e perseguem os crentes verdadeiros de "a sinagoga de Satanás". Eles não são mais seu povo.
"Eis que o diabo está para lançar em prisão alguns dentre vós para serdes postos à prova." Por trás dos perseguidores romanos vemos os judeus, cheios de inveja maligna e de ódio contra os crentes, acusando-os perante os tribunais romanos. E esses judeus, por sua vez, eram instrumentos usados pelo próprio diabo. O diabo lançaria alguns em prisão, o que, geralmente, significava morte. Mas enquanto Satanás estivesse tentando os crentes, Deus, por essa mesma aflição, os estaria provando, testando, provando: "para serdes postos à prova". Essa tribula­ção duraria "dez dias", isto é, um tempo definido, cheio, mas breve.[4] O fato de que a provação é por breve tempo é uma palavra dada, geralmente, como encorajamento à perseverança (Is 26.20; 54.8; Mt 24.22; 2 Co 4.17; 1 Pe 1.6).
"Sê fiel até a morte" não significa meramente "ser leal até morrer", mas "ser fiel ainda que isso custe a vida". Disse o piloto, que navegava em seu barco num mar tempestuoso: "Pai Netuno, tu podes fazer-me naufragar, se quiseres; tu podes me salvar, se quiseres. Qualquer coisa que aconteça, porém, eu segurarei firme o timão". Uma atitude igual é requerida aqui - o que quer que aconteça, segure firme o timão; sê fiel até a morte. Aqueles que são fiéis é prometida a coroa da vida, a saber, a vida de glória no céu.[5] Ainda que os crentes possam sofrer a primeira morte, eles não serão feridos pela segunda morte, isto é, eles não serão jamais lançados, corpo e alma, no lago de fogo, na segunda vinda de Cristo (Ap 20.14).
Esmirna era fiel ao seu chamado para ser um candeeiro. O testemunho de Policarpo, dado na presença de judeus e de pa­gãos, foi imitado por outros.[6]


[1]Ante-Nicene Falhers, I, pp. 37ss.
[2]Ver W. M. Ramsay, op. cit., p. 269. Ele parece provar esse ponto com respeito ao significado do aoristo aqui empregado.
[3]E. H. Plumptre, op. cit., p. 91.
[4]Ver W. Milligan, op. cit., p. 845.
[5]Ver E. H. Plumptre,     cit., nota na página 97. Esse não é um diadema real, mas a coroa da vitória.
[6]Sobre a presente condição de Esmirna, ver E. L. Harris, em artigo citado ante­riormente.